Nunca li Camões.
E nesse exato instante não lembro de alguém mais próximo que tenha folheado um livro dele.
Pena, uma rápida vasculhada googliana revela versos que a gente até já viu por aí:
“Amor é fogo que arde sem se ver
É ferida que dói e não se sente...”
ou
“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
Muda-se o ser, muda-se a confiança...”
Talvez eu padeça de estofo cultural para absorver Camões. Mas não de sensibilidade.
Conheço uma expressão que leva sua assinatura: “desconcerto do mundo”.
Pois não é justamente do desconcerto da vidinha que a literatura se apropria, criando romances, contos e poesias? Apropria-se das angustias e dos medos da humanidade, da mesquinhez, da ganância e da sordidez para gerar personagens maravilhosos.
A literatura absorve as traições e as paixões, os enganos e desencantos dos outros para inventar enredos e dramas que atravessam os tempos.
Sim, a literatura se alimenta da vida e também da morte dos outros.
E de tudo isso, mais o próprio desconcerto pessoal do escritor, se nutre a literatura.
Não quero afirmar categoricamente o que já suspeitava: tudo ao nosso redor é material literário. E são os próprios autores em suas palestras, autobiografias, entrevistas em jornais e revistas que esclarecem e desmistificam suas obras: “ta tudo aí, dentro e fora de casa.”
Sim, Machado de Assis, poeta, cronista, romancista que o diga.
Do cotidiano das ruas de um Rio de Janeiro provinciano para as paginas de “A mão e a luva” que, aliás, não é de espantar o sucesso que fazia Machadinho: ascensão social é tema para fofocar – ou escrever - até hoje.
Do cotidiano das ruas de um Rio de Janeiro provinciano para as paginas de “A mão e a luva” que, aliás, não é de espantar o sucesso que fazia Machadinho: ascensão social é tema para fofocar – ou escrever - até hoje.
A troca de amores e favores, os interesses por amizades – tudo o que nos ajuda a galgar degraus no nosso emprego, no grupo social, na paróquia, o desconcerto das relações humanas, a literatura absorve e transforma em “Laços de Família” ou “Vidas Secas”.
E assim eu, de alguma forma, cheguei até “Intrigas da Colônia”, com lançamento agendado para a próxima 4ª-feira, 18h, na Palavraria – Livraria e Café, no bairro Bom Fim, rua Vasco da Gama, 165, em Porto Alegre.
A gente se vê?
* Minha crônica deste findi nos jornais A Hora, Lajeado e Opinião, Encantado.
Um comentário:
Profunda tua crônica. Falaste em Camões e Machado de Assis. Recebi da Marlene Spohr, coordenadora de Letras, da Univates, pedido para divulgar o site www.dominiopublico.gov.br que corre o risco de ser desativado, por falta de acessos. Há mais de 300 obras, que podem ser baixadas gratuitamente. Fernando Pessoa, Machado, Camões, Saramago e muito mais estão lá. Vale aa pena acessar. Nao pode ser desativado! Parabens pela crônica.
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