sábado, 8 de maio de 2010

CULTURA GOELA ABAIXO




Revista Brasileiros - Você teve uma infância muito rica. Repleta de brincadeiras e jogos lúdicos. Acha que ainda há espaço para a imaginação na infância de hoje?
Guto Lacaz - Acho que a infância vai ser sempre infância. Tenho nostalgia da minha, mas acho que um garoto de hoje, quando tiver o neto dele, vai ter nostalgia do playstation. Vejo pela minha filha, Nina. Ela adora o Orkut, mas gosta também de construir, de desenhar. Essas brincadeiras não morrem. A infância é isso: um período em que a pessoa está sempre buscando, se enfiando em armários, embaixo de mesas, fazendo cabana. Isso nunca vai acabar. Esse período especulativo, lúdico, e às vezes perverso, está mais na cabeça das crianças do que nos brinquedos que elas têm à mão.


Brasileiros - E como você vê, hoje, as reprovações que teve na escola? Tinha problemas de disciplina? Lidava com ambientes muito rígidos?
G.L. - Nunca tive problemas com disciplina. Sempre fui tímido e era muito disperso. Repeti o terceiro ano primário e, depois, o primeiro ano ginasial. Foi quando entrei para o Colégio Dante Alighieri e achei tudo aquilo horrível. Uma vez, um menino da classe fez uma malcriação qualquer e, logo, veio o diretor. Parecia o Mussolini: "Se ninguém vai dedar e ninguém vai se entregar, todo mundo vai passar o recreio inteiro em formação no corredor". Nós ali, em fila, obrigados a ficar de cabeça baixa. Pensei: "Caceta, olha onde eu caí!". Em seis meses, já estava condenado!
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Brasileiros - Foi então que sua mãe descobriu o Liceu Eduardo Prado que, além das disciplinas convencionais, ensinava eletricidade, desenho, trabalhos manuais, eletrônica. Enfim, as coisas que te interessavam. Foi aí que se encontrou?
G.L. - Com o detalhe que no Liceu não havia notas, só conceitos! Foi lá que encontrei meu primeiro ecossistema. Chegava pros amigos e dizia, envergonhado: "Pôxa, eu repeti dois anos". E eles diziam: "Ah, eu repeti cinco!". Era o lugar dos casos perdidos e aí eu me encontrei.

Brasileiros - Você acha que esse problema de diálogo com o público está sendo superado?
G.L. - Tem muita obra metida. Tem certos artistas que se acham. Vem um crítico amigo deles e faz um manual, que ensina como ver aquilo. Mas esqueça o artista, esqueça o manual do crítico, pois a obra é sempre você e ela, e se ela for ruim, arrogante, você tem de olhar e concluir, sem pudor: "Grande merda, já vi coisa muito melhor!". Alguns artistas são bem ligados aos críticos e, muitas vezes, o mercado precisa de alguém que os endosse. São valores de mercado, mas tua relação com a obra de arte é pessoal e independe de tudo. Basta apenas um momento seu com aquilo. Ninguém te tira isso.

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