sexta-feira, 8 de julho de 2011

CRÔNICA: A MULHER QUE CANTA


Um amigo querido sempre me aconselha a não dar conselhos sobre filmes.
Só porque gosto de filme iraniano, uruguaio ou japonês. Entendo. Mas desobedeço e tenho certeza absoluta que 80% das pessoas que gostam de cinema vão se sensibilizar com “Incêndios”. Não, não é filme-catástrofe.
Ou é?
Catastrófico-e-grandiosamente-humano.
Desculpe, não é película hollywoodiana. É canadense.
Sim, e uma história recheada de revelações e segredos chocantes que giram em torno de Nawal Marwan, mulher com a vida marcada por tragédias que se iniciam com o desaparecimento do primeiro filho, quando o pai é assassinado. Daí um calvário  com oscilações de tempo desde a morte de Nawal. De herança, seus filhos gêmeos que vivem no Canadá recebem dois envelopes. Para total surpresa eles devem procurar um irmão e o pai e entregar-lhe esses envelopes. Detalhe: os irmãos gêmeos não sabiam da existência de nenhum dos dois que viveram em Daresh, a cidade fictícia na opção do diretor Denis Villeneuve.
*
Minha pobre visão geográfica diria que o filme  se passa na Síria ou na Jordânia ou no Líbano, mas não passa daí, porque até as bandeiras que aparecem em cena não dão indício exato de nacionalidade. O filme é tão envolvente que logo descobrir a pátria perde o interesse. O cenário pode ser em qualquer lugar arenoso do Oriente Médio onde aconteceu uma guerra civil em nome de princípios religiosos e com seus crimes de guerra nunca julgados.
“Incêndios” narra a história de uma mãe que sobrevive a todo tipo de preconceitos e cujo destino dramático  se encaminha para um final digno de uma tragédia grega ou shakespeariana.
Eu me emocionei muito, sofri e me extasie com o enredo. E quando terminou o filme, ainda atordoada, corri para o Google atrás de informações sobre diretor, atores, onde foi filmado, premiações, críticas, enfim. Descobri que a bela trilha sonora inclui a melancólica “You and Whose Army?” do Radiohead, bem de acordo com a cena comovente que se assiste.
Sugiro que não faça o mesmo antes de ver “Incêndios” que já entrou para a galeria dos filmes de finais surpreendentes.
Foi indicado para o Oscar deste ano.
Mas perdeu para o dinamarquês “Em um mundo Melhor”.
Nada que tire o seu brilho como filme cinco estrelas.

*
O filme “Incêndios” é uma busca pela compreensão da Verdade. No caminho, o ímpeto e o assombro da vingança. Vale algumas especulações filosóficas:
A Verdade é necessária mesmo quando subjugada ao Horror? Como diagnosticar o impacto da Verdade num sistema social regido pelas aparências? Existe uma forma de revelar a Verdade que não seja por uma mal disfarçada necessidade psicológica? Ou religiosa? De quantas maneiras possíveis se constrói uma Verdade?
Quando você assistir “Incêndios” lembre-se: “antes Esperança do que a objetividade da Verdade” - dizia um cara chamado Rorty.

3 comentários:

Anônimo disse...

Laura, me aconteceu exatamente o que você tão bem escreveu. Anotei os nomes que iam sendo mencionados para tentar localizar no google onde se passa a história. O filme é genial. Me chamou muito a atenção a maneira como a verdade chega para a protagnista que nem a procurou. Verdade é assim.
Parabéns pela objetividade da sua analise, muito inteligente.
Rute-rute237@hotmail.com

Anônimo disse...

Laura,
Muito bem escrito. Parabéns.
Acabei de ver o filme e, ao contrario de vcs
, mesmo antes que terminasse, corri para o google e te encontrei.
Cláudia Maria
Claudinemaguisi@gmail.com

Décio disse...

Pena que este tipo de cinema não seja tão divulgado. Vi no cinema. O filme termina e os espectadores permanecem sentados, num silêncio ensurdecedor. É visceral. Como diz uma vizinha: " com entranhas comovidas ". Parabéns pela resenha. Vale a pena ver e rever.