photo by Sigit Pamungkas
1 O sentido da nossa existência enquanto pais,
um sofrimento solitário. Em quanto humanidade que somos, um vasto todo.
Análises objetivas e técnicas, esclarecimentos políticos,
interpretações ambíguas e fraudulentas. Nada que ampare, nada que encoraje
retomar o curso da vida com compreensão dessas arestas reais. A dor continua,
os dias caem e as conseqüências se esvaziam.
O que nos falta, Santa Maria?
A ética das relações
inter-humanas.
Onde cada um se põe no lugar de cada um. Porque o lugar dos
outros é indispensável para a nossa realização existencial. Não sou eu que
escrevo. É Martin Buber.
Mas não conseguimos nos colocar no lugar do outro porque
vivemos a Era de Narciso. Nunca, tanto. Mais, a plenitude da Década Egomaníaca.
Será que Buber poderia imaginar isso no início do século XX? Ele que fala sobre
a procura constante do verdadeiro em meio às múltiplas verdades? Estou chamando
por socorro, estou morrendo, mas estou on-line no facebook. Eis uma reflexão
ontológica para abordagens de estudos acadêmicos. Se já não.
2 Santa Maria? É quase uma utopia acreditar
que, a partir daquela madrugada de desespero, a sociedade mude. Nem os jovens,
nem qualquer categoria por idade, classificação social ou econômica. Nem
gaúchos, mineiros ou amazônicos. Não mudaram com as Cruzadas, com as chacinas
indígenas, com o holocausto judeu ou apartheid africano. Está no gênese da
ambição humana. Diria que na filosofia do diálogo pós-moderno, o homem e seu
saldo bancário. Acima do diálogo homem-família. É pelo “ouro” que nos
desimportamos com os outros. Construímos prédios, cortamos árvores, desviamos
rios, deixando rastros poluidores. É pelo “ouro” que não seguimos as leis e os
planos de prevenção e proteção contra incêndios. É pelo “ouro” que burlamos as
regras, conquistamos terras, matamos e aniquilamos com a dignidade dos povos.
Desde Caim, desde a concretude da vida. Somos meros espectadores das experiências humanas. Das mais ultrajantes e
sórdidas. Mas, também das mais generosas. Sim, a televisão nos dá essa dimensão
em tempo real, ao vivo. Se não, outro blefe humano atrás do “ouro”.
3 A Cabala
é a sabedoria espiritual mais antiga do mundo. Nos seus fundamentos, a
responsabilidade de cada homem pela existência a ele confiada. Na Década de
Narciso, essa responsabilidade inexiste. Porque nunca carecemos tanto de ética. Está
aí o Senado brasileiro para assinar
embaixo com a presidência de Renan Calheiros. Só o Eu é que vale. Ouro, brilho,
espelho, fundamenta o nosso modo de existir. Mais explícito? Que aqueles que devem respostas a Santa Maria não sejam
ofuscados por esse ouro.
* Minha crônica jornais A Hora, Lajeado e Opinião, de Encantado.
Um comentário:
Muito boa.
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