sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

DISCUTINDO AS RELAÇÕES...

Em debate na mídia, pululando nos blogues, a criação de uma Comissão Nacional da Verdade para apurar as violações de direitos humanos cometidas durante o regime militar.

Aqui nesse espaço, as divergências e opiniões são as mais estapafúrdias. Dou por obra da nossa alienação histórica. Mas nada impede que a gente se informe, leia, compare as opiniões de quem viveu – e sofreu – a época.

Para os interessados, alguns excertos de entrevistas sobre o assunto:

Socióloga argentina ELIZABETH JELIN:

“No Brasil não houve uma Comissão de Verdade oficial, mas o informe Brasil Nunca Mais (livro que documenta as violações de direitos humanos cometidas pelo regime militar, compilado por Dom Paulo Evaristo Arns nos anos finais da ditadura, mas publicado apenas em 1985) teve um impacto parecido com o dos relatórios das comissões em outros países.

Em vez de julgar os responsáveis pelas violações de direitos humanos, o que se pode é trabalhar com a ideia de
“verdade histórica”.

E isso tem uma importância ritual muito significativa no momento. Assim, chegou-se ao ponto atual, como aconteceu recentemente no Peru, onde a Comissão de Verdade, além do sentido de reparação simbólica, tem a função de reunir material importante para futuros julgamentos. Por isso muitos militares temem que a Comissão de Verdade, em vez de encerrar as contas com o passado, abra a possibilidade de julgamentos penais.

Para grande parte da população do Brasil a ditadura não foi algo tão significativo, é uma questão de vítimas mais diretas.

Isso acontece em todos os países.

Há muita gente que diz: “Deixemos o passado para trás, vamos olhar para a frente”.

Há alguns dias, um dos líderes do partido conservador que governa Buenos Aires reclamou que se fala muito do passado e sugeriu a criação de uma nova lei da impunidade para acabar com todos esses julgamentos abertos. Mas são reações paradoxais, que têm um efeito contrário ao desejado.

Toda tentativa de encerrar as discussões sobre o passado provoca o surgimento e o fortalecimento de grupos que querem manter o debate aberto.


As contas com o passado não podem ser fechadas.

Não há possibilidade de dizer “Acabou” — assim como não há essa possibilidade na Alemanha, no Japão. As saídas políticas são apenas conjunturais, mas com o correr do tempo outras necessidades sociais forçam a reabertura dos debates.”



CARLOS FICO, historiador: "A Lei de Anistia foi o principal componente da transição brasileira para a democracia. Havia consciência clara entre os parlamentares que a menção aos “crimes conexos” era sim um perdão aos torturadores.

Considero que essa menção foi posta ali de maneira dúbia para resguardar não só os torturadores, mas todos os militares, inclusive os generais, que foram responsáveis por uma série de graves irregularidades. O regime militar não teria aceitado de maneira nenhuma a não inclusão desse perdão."


DANIEL AARÃO REIS, historiador: Para mim, a questão central é discutir a política como tortura de Estado, fazer a sociedade brasileira pensar nisso. Mas me parece também importante processar os torturadores. Porque eles cometeram crimes contra a Humanidade, e esses crimes são imprescritíveis segundo tratados que o Brasil assinou.

FICO: Os comandantes militares estão cometendo um erro enorme persistindo nessa atitude acovardada, defensiva, de não reconhecer o erro, ficar retendo documentos. Eles deveriam reconhecer em termos institucionais e históricos esse erro, e se desculpar por ele. Isso seria um passo importante para tornar as Forças Armadas mais dignas diante da sociedade brasileira. O Estado brasileiro reconheceu sua responsabilidade em relação a esses crimes de tortura e assassinato, mas as Forças Armadas até hoje não reconheceram.

O jornal O Globo fez uma pesquisa no site perguntando aos leitores o que eles achavam dessa discussão. A opção mais votada era favorável à revisão, desde que fossem processados também os grupos de esquerda.
REIS: É fundamental informar a essas pessoas que os grupos de esquerda já foram processados. E muitos militantes, sobretudo os que foram presos, foram torturados e mortos.
Reabrir o processo das pessoas que já foram processadas?
Se alguém ainda falta ser processado nesse país são os torturadores.
FICO: Muita gente embarca na história contada pelos militares segundo a qual a polícia não tinha condições de enfrentar os grupos armados. Isso é conversa fiada.
As pesquisas históricas mostram que o regime tinha toda condição de enfrentar as ações armadas dentro da legalidade. Por que isso não foi feito?
Porque essa repressão violentíssima, de tortura e extermínio, não visava apenas as ações armadas urbanas e a Guerrilha do Araguaia, muito menos passeata estudantil. Foi um processo repressivo com uma abrangência muito maior.



REIS: Uma das justificativas das Forças Armadas para fazer a repressão foi que o Brasil vivia uma guerra, uma guerra suja onde não havia leis etc. Mas é evidente que o Brasil não viveu uma guerra.
Aquilo fazia parte das expectativas de grupos revolucionários, dos quais eu participei, mas que em nenhum momento alcançaram ressonância social.
O governo brasileiro tinha todas as condições de debelar aquele surto revolucionário sem recorrer à tortura como política de Estado.
Tivemos no Brasil grupos que tentavam derrubar a ditadura não com ideais democráticos, mas para instaurar uma ditadura revolucionária. É bom que isso volte ao debate. Como também é importante que se diga que os integrantes desses grupos já foram julgados, condenados e torturados."



6 comentários:

Anônimo disse...

Essa história passa por vezes a impressão de que foi torturado ou sofreu com a ditadura pensa muito mais em reparação financeira do que qualquer outra coisa...
A busca é por reparação moral em cima ideais filosóficos que igualavam as pessoas e que foram triturados pelos ditadores do passado é o que dizem os incomodados..
Porém o que se vê e lê é gente pedindo dinheiro e grande para o estado..O que tem o resto da população a ver com isso ?
Tirar grana do erário prá reparar incomodados do passado é injustiça com outros que precisam de ajuda e não tem de onde tirar pois o estado é cego prá eles tbm..
Muitos não foram perseguidos e não estão nem aí prá quem foi...
Dinheiro parece ser o alvo dessa guerra de alguns "perseguidos" !
A fome atual das crianças envergonha e preocupa muito mais o país do que política do passado , embora a ditadura tenha feito merdas tbm claro...Mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é bem outra coisa...

Jorge disse...

é o principio da repetição fazendo efeito e criando verdades. Inventaram os ANOS DE CHUMBO para agora dar razão aos ANOS DE OURO, e o cidadão do país dos tolos pagando a conta.

JORGE LOEFFLER .'. disse...

Houve muita covardia naquele período. Digo de cadeira pois vivi nele. Estivee por uns dias no DOPS e lá estava quando o sargento Manoel Raimundo Soares foi libarado, na noite de 13 de agosto de 1966. Na ponte sobre o riacho, partindo do Palácio da Polícia em direção ao centro da cidade ele foi apanhado por dois indivíduos trajando aquela capas de gabardine, enfiado num Gordini escuro e só voltou a ser visto na noite de 23 para 24 de agosto, véspera do aniversário da morte do Presidente Vargs, quando seu corpo foi localizado no Guaíba, próximo de uma das ilhas. Cheguei até a ser acusado por este homicídio com o qual nada tive a ver. Sei o que minha família passou. A coisa foi tão séria que bateram à porta da casa do meu irmão em Curitiba e igualmente à porta da casa de uma prima que residia em New Ark, New Jersey, USA, para saber qual o grau de parentesco. Eu quero abertura de todos os arquivos, pois quero saber quem foram os bandidos que o mataram. Eu e todos as pessoas de bem queremos sabar quem são eles. Somente quem tenha rabo comprido não deseja tal.

Anônimo disse...

deve ter ocorrido neste caso mais um dos tantos JUSTICIAMENTOS, executado pelos seus companheiros.

JORGE LOEFFLER .'. disse...

De forma alguma.
Ele foi assassinado por membros do estado brasileiro, provavelmente militares das forças armadas ou da polícia ostensiva que era muito ativa na repressão política, tenham certeza disto.

Juarez C. disse...

A resposta do REIS é digna de uma Fantasia de Carnaval... "É fundamental informar a essas pessoas que os grupos de esquerda já foram processados", SIMPLESMENTE HILARIANTE. O correto seria dizer que êles foram AGRACIADOS com polpudas indenizações. Aliás o texto todo é uma grande palhaçada. Acho até que vou a POA para o Fórum e rir mais um pouco.