sábado, 26 de maio de 2012

EDUCAÇÃO PRISIONAL: O SABER LIBERTA?


No dia 25 de maio de 2010, Lula sancionou uma lei que autoriza a instalação de salas de aula em presídios. Ontem a lei completou dois anos...

"A norma altera a chamada Lei de Execução Penal (7.210/1984) para permitir que sejam instaladas salas destinadas à realização de cursos do ensino básico e profissionalizante.

A mudança foi proposta no Projeto de Lei 217/06, do senador Cristovam Buarque (PDT-DF): o preso brasileiro não pode ser privado do direito básico à educação.
Justificando a proposta, o ex-ministro da Educação do governo Lula diz que a construção das salas de aula são um primeiro passo para combater o analfabetismo no sistema carcerário. "
Mas deve ser mais uma dessas leis criadas para não serem cumpridas. Presídios superlotados e com péssimas condições vão dispor de sala de aula? Ou vão aproveitar outra cela para aliviar a capacidade física?

Uma rápida pesquisa na internet revela algumas iniciativas que, do conforto da minha casa, parecem exitosas: Presídio de Varginha, em Minas, de Sepé na Paraíba, Rondonópolis, no Mato Grosso e tantos outros mais. Aqui no blog já falei da Universidade da Paraíba que dá aulas no presídio. Questionada, a Univates não se manifestou.
Chego ao Presídio de Lajeado. Um fluxo de 600 homens condenados. O corredor de entrada poderia ser de uma escola estadual. Nem melhor, nem pior. Não vejo sequer um detento. Mas seus familiares aguardando a revista. No fundo do corredor, grades e trancas. E agentes penitenciários.

São eles que guardam minhas chaves e máquina fotográfica. Só então posso sentar com a professora Marisa Mullich, 59, solteira, graduada em Matemática pela Unisc, para conversar na salinha da assistente social e da psicóloga, que gentilmente cederam o local.
Marisa era professora no Castelinho. Um dia foi designada para atender o Presídio de Lajeado. É uma professora discreta. Fala baixo e pensa muito antes de falar. Tenho curiosidade sobre a "sala de aula" de seus alunos. Fotografar só com autorização do juiz e do delegado. Marisa assegura que é uma sala de aula normal, com quadro-negro e cadeiras-classe. E grades.

O número de alunos varia. Às vezes 20, às vezes 30. É professora de condenados, ou à espera de sentenças da Justiça, há 14 anos. Começou dando aulas no presídio de Arroio do Meio em 13 de abril de 1998. Para ela o aluno-detento daquela época é muito diferente do aluno-detento de hoje: "São muito mais jovens."
No presídio de Lajeado a professora cumpre suas funções desde 2009. "A realidade dos dois presídios (de Arroio do Meio)  são totalmente diferentes" – garante, sem especificar detalhes.

O aluno-detento não tem compromisso com ninguém. Não tem pai nem mãe cobrando tema.  E  “tema de casa” é uma ironia. O tema já é refletir na cadeia, empilhado - penso. Não é diferente de algumas universidades: 6o alunos por sala...

 “Venho até aqui dar minhas aulas. Não me envolvo com nada mais do que cadernos e livros, que eu mesma trago, que empresto. O aluno-detento só tem compromisso com ele mesmo: o de aprender. E a cada 12 horas de aula ele ganha um dia a menos lá dentro.” E esse “lá dentro” todo mundo sabe do inferno que deve ser – imagino. 
Centro de Recuperação Agrícola Silvio Hall de Moura, em Santarém.

A professora Marisa conta que os rostos na sala de aula mudam muito: “Porque eles são absolvidos, são transferidos.” Ela não é alfabetizadora e por sua sala já passaram alunos-detentos universitários e alunos com mais de 60 anos, mas a maioria encontra-se na faixa de 20-30 anos.
Procura não se envolver com os problemas dos alunos, nem saber dos motivos que os levaram até às grades. “São alunos como quaisquer outros. Quantos não tiveram educação? Aqui sou tratada com respeito e respondo do mesmo modo. São seres humanos. E para mim, alunos normais. Nem penso sobre seus crimes. Não é uma situação normal de sala de aula, mas também me realizo como educadora. Não tenho medo e nem lembro de rebelião.”

Na metodologia, textos e filmes. No momento da nossa entrevista, os alunos assistiam Hobin Hood, o herói fora-da-lei que roubava dos ricos para dar aos pobres. Eles devem fazer a reflexão sobre o que assistiram, o que sentiram e qual a lição extraída do filme – diz a professora.

“A partir do 2º semestre trabalho mais em cima das disciplinas de Português e Matemática. No final do ano alguns fazem a prova do Enem. Passando, ganham o certificado de ensino secundário.”
Marisa comparece todas as manhãs e mais duas tardes ao Presídio em Lajeado. E duas tardes ao Presídio de Arroio do Meio. Seguidora da filosofia espírita, a professora encerra a entrevista:
“Se eles estão presos, de certa forma também estou. Como saber exatamente o porquê de eu estar aqui dentro? A diferença é que durmo em casa.”
Vou embora pensando livremente sobre que tipo de apoio pedagógico a professora recebe do Estado. E se realmente a educação salva e liberta através de uma ressocialização. E se existe alguma chance de recuperação de uma classe já fracassada na escola da vida.

A gente sabe que o direito à educação é inalienável - todos devem ter acesso,  livres ou não.  Mas que diferença faz quando se sabe de presidentes da república, senadores, deputados, juízes, advogados, delegados, e tantos outros que tiveram acesso a educação mas não deixaram de  cometer todo tipo de crime e corrupção? Pior: continuam e e estão soltos.

NEEJAs PRISIONAIS 

"A Lei de Execução Penal, instituída pela Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, prevê a assistência educacional ao preso e internado, sendo obrigatório o ensino fundamental a esta clientela. Portanto, é dever do estado facultar a modalidade de ensino, que, no presente caso, os NEEJAs cumprem a função.

Sendo assim, se existe demanda expressiva na casa prisional, disponibilidade de infra-estrutura técnico-administativa e pedagógica exclusiva para o funcionamento do NEEJA, cabe a cada CRE prover recursos humanos habilitados, para dar conta ao previsto na Lei de Execução Penal.”

5 comentários:

Bernildo disse...

E tem gente achando que o Brasil está quase no primeiro mundo...

Anônimo disse...

Vamos colocar os estudantes da Univates lá para estagiarem, quem sabe saem do comodismo e aprendem alguma lição de vida.

Anônimo disse...

ANONIMO:

Não acredito que detenção seja lugar de lição de vida.

Não entendo porque tem que ser a Univates. Pode ser qualquer professor.
E é tão fácil apontar quem tem que ser.

Não penso que ninguém precise correr atrás de lições de vida, a vida já atropela a gente. E a gente por bem ou por mal, aprende.

Respeito muito quem faz algo assim e entendo muito bem quem não faz também. Aliás todo mundo faz a sua parte pagando estes trilhões de impostos e votando. Porque mesmo não acreditando em nada a gente é obrigado a pagar e a votar.

Não me acho nem mais e nem menos que alguém que foi preso. Só alguém que ainda se esforça para cumprir as leis. Mas, de forma alguma acho que eles são lição de vida... por favor!

JORGE LOEFFLER .'. disse...

Vou entrar numa briga feia. Não faz mal, pois a minha vida foi assim e vai continuar. Interessante que muitos estudantes dessa e de outras universidades, especialmente alunos dos cursos diuturnos cujas famílias têm mais posses fizessem pelo menos uma visita a essa ou qualquer outra casa prisional para que pudessem a partir de então saber como é a vida de fato. Estudei à noite e nada tenho contra os que estudam durante o dia. Quero apenas que vejam e sintam como é a vida real. Por certo mal não lhes fará.

serjao disse...

Derrepente, acho ate "louvavel" de parte do Governo oferecer cursos proficionais aos detentos.Mas, nao seria mais produtivo oferecer as condicoes nescessarias a todos os individuos interessados ANTES de optarem pelo crime? Talvez muitos deles estariam empregados hoje, em vez de "guardados".